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segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Relato de um viajante no México

Nem tudo é autogoverno das comunidades zapatistas, autogestão material e simbólica. Por Índio Andante

Dias 15, 16 e 17 de outubro

Comecei uma parte mais roots da viagem, estou ainda na casa de um companheiro da Rádio Proletária de Chiapas. Está interessante aqui, porque estou podendo observar, um pouco mais além das utopias, como funcionam outras lutas sociais no México. E que nem tudo é autogoverno das comunidades zapatistas, autogestão material e simbólica. Porque se o dinheiro do Estado foi retirado dos trabalhadores, então é um direito socializar esse dinheiro, reivindicar esse dinheiro para quem trabalha de fato. Algo muito mais próximo daquilo que faz o MST. Se a gestão dos recursos públicos acaba encaminhando o movimento para uma burocratização, isso já é um outro debate, que talvez aqui não esteja em questão.

chiapas-2De fato, desde sexta estou em um morro de Tuxtla, uma área de ocupação urbana chamada “12 de novembro”, onde está a Rádio Proletária e onde a OPEZ (Organização Proletária Emiliano Zapata), um braço do movimento agrário que existe em todo o México, possui dois ou três espaços da organização, em meio às moradias. O bairro aqui é uma ocupação. Precário, falta água e tudo o mais, mas já tem algum asfalto, uns cibercafés, videocassetes, uns carros loucos… Lembra muito as periferias do Brasil… viu?

Bom, o fato é que a polícia fechou a Rádio Proletária na terça-feira, dia 13 de outubro, alegando que estavam dando voz às manifestações da OPEZ em frente ao palácio do governo de Chiapas, onde reivindicavam a libertação dos presos políticos que foram detidos em 16 de julho e 22 de agosto, ambos dirigentes da OPEZ.

A OPEZ faz parte do Movimento de Libertação Nacional (MLN), que se formou a partir de uma fusão de sindicatos, camponeses, indígenas, jovens e estudantes no ano de 2007. Estive conversando com um grupo de pessoas do movimento - igualzinha (mas diferente) àqueles com que esbarramos por aí no MST, no MTST… Tem o beberrão expansivo, o malandro mulherengo “come quieto” [“que se faz de santo”], as mulheres sempre de luta, o sério militante que só fica fitando o pessoal de longe, etc… O problema é entender o espanhol matuto [sertanejo] que eles falam. Mas estou conseguindo me comunicar, sim.

chiapas-3De noite os caras da rádio exibem um filme na praça pública da comunidade. Ontem exibiram documentários sobre San Salvador Atenco (cidade próxima do DF México, onde um movimento camponês pró-zapatista resistiu contra a construção de um novo aeroporto e foi brutalmente reprimido por cerca de 3000 policiais, agentes P2, paramilitares do PRI, etc., com cobertura escrota [reles, grosseira] da TV AZTECA e da TELEVISA - respectivamente propriedades do segundo e do primeiro mais ricos do México).

Também passaram um filme sobre o movimento zapatista, da época do levante, coisa de revirar o estômago.

A gente jovem do OPEZ sonha com os EUA, os mais velhos já estão aqui de novo, porque ou já trabalharam como coyotes (facilitadores da migração para os EUA) na fronteira do Rio Negro ou porque já foram deportados pelos putos [pela bófia] da LA Migra estadunidense. Essa é a dura realidade mexicana, tão longe de Deus e tão perto dos EUA. Os camponeses da OPEZ habitam um ejido [propriedade agrária de uso comunal] autogestionado em Herradura, a duas horas de carro de Tuxtla, cujas casas foram construídas pelos próprios membros do movimento (OPEZ) e bancadas [pagas] com dinheiro do Estado…

Adeus. Hasta luego cabrones y chicas!

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